Deformidades na coluna podem ser a consequência do uso de salto alto demais por crianças. E esse é o tema de uma reportagem do jornal Zero Hora em que é alertado o risco desse uso, principalmente porque a coluna ainda está em desenvolvimento. O coordenador da Comissão de Coluna da SBR, o reumatologista Marcos Renato Assis, explica em detalhes o que significa crianças usarem saltos altos demais.
De início, ele descreve os efeitos de saltos altos em geral. Segundo ele, saltos altos deslocam uma parte do peso do corpo para a extremidade anterior do pé e solicitam alterações na postura corporal para manter o equilíbrio. “Há estudos mostrando alterações da angulação dos membros inferiores e da coluna; aumento da carga sobre articulações dos pés e dos joelhos; aumento de contrações musculares e do gasto energético com o uso de salto, principalmente a partir de 5 cm de altura”, salienta. E isso, diz Assis, aumenta a carga sobre os dedos e as articulações da parte da frente do pé, favorecendo o aparecimento do hallux valgus, uma deformidade conhecida como joanete. “A parte interna (medial) dos joelhos e a articulação atrás da patela também são sobrecarregadas e podem estar mais sujeitas a desgastes da cartilagem (osteoartrite)”, explica Assis, salientando que o efeito sobre a coluna parece ser mais complexo, mas tem sido associado principalmente à dor lombar.
Considerando especificamente saltos altos em crianças, Assis explica que os ossos têm uma programação de desenvolvimento, mas sofrem influências das cargas que lhes são aplicadas, por isso sob pressões prolongadas em sentido diferente do habitual, podem sofrer alteração de sua conformação. “Notem que por esse princípio agem algumas órteses utilizadas em crianças, por exemplo um colete para tratamento de deformidade na coluna deve ser usado enquanto o esqueleto está em desenvolvimento”. Assim, diz Assis, uma criança que use salto alto de modo prolongado pode ter modificada a conformação dos ossos do pé, além de sua postura, colocando os joelhos muito para trás (recurvatum) ou arrebitando o quadril (hiperlordose lombar).
Quanto à altura Considerando uma altura de salto que não incorra em riscos a quem usa, Assis explica que, no adulto, há estudos que sugerem que saltos com até 2 cm de altura não promovem alterações de risco para as juntas entre os pés e os dedos (metatarsofalangeanas), “mas não se pode extrapolar esse valor para crianças, principalmente porque estão em fase de desenvolvimento e podem modificar sua estrutura óssea, seu alongamento e equilíbrio muscular ou sua postura” Assis salienta ainda que a proibição de saltos altos demais nas crianças deve durar pelo menos até a primeira menstruação.
Ele explica que as mulheres têm a maturidade do esqueleto ósseo muito associada à ocorrência da primeira menstruação, portanto antes disso não é aconselhável que tenham por hábito o uso de salto alto. “Cabe ainda lembrar que a demanda por uso de salto alto associa-se fortemente a padrões sociais de beleza e ao desejo de ser aceita em seu meio. Os pais devem estar atentos para que a valorização e auto-estima não estejam desequilibradas e fundamentadas apenas em aspectos físicos”, ressalta Assis. Então, como convencer a criança a esperar para usar saltos muito altos? Segundo Assis, é importante ter consciência de que certas coisas são inadequadas para crianças e podem ser inócuas ou ter menor impacto em adultos. Assim, diz ele, cabe aos pais ou responsáveis pela criação educar as crianças com limites e orientações de cuidados à saúde.
Da mesma forma que não se recomenda às crianças a ingestão alcoólica, a privação de sono noturno ou determinados programas da televisão, deve ser explicado que os saltos não são para uso regular por crianças, ressalta o reumatologista. “Não há problema em crianças brincando por exemplo com os sapatos altos da mãe, mas não se deve comprar um calçado desse tipo para ela, o que poderá propiciar a exposição prolongada à postura e à marcha inadequadas”, diz Assis. Para ele, se os pais estiverem conscientes disso e encontrarem uma maneira clara de se expressar dizendo que “ainda não estão na idade”, que é para “não deixar tortos os pezinhos ou as costas”; serão criativos e bem compreendidos.
Jornalista Responsável: Maria Teresa Marques