Uma entrevista concedida à Revista Veja, neste mês, levantou a relação entre depressão e dor. Para o entrevistado, Stephen Stahl, psiquiatra especializado em neurologia e professor da Universidade da Califórnia, nos EUA, a depressão causa dor. E isso, de acordo com ele, só tem sido aceito pelos psiquiatras nos últimos tempos. “Entendi que os neurotransmissores (substâncias químicas responsáveis pela comunicação entre os neurônios) envolvidos nos quadros depressivos estavam associados também à sensação de dor e poderiam ser afinados com medicamentos tal qual um músico afina seu instrumento”, disse Stahl.
A afirmação traz à tona o modo como os especialistas encaram a dor de seus pacientes nos dias de hoje, considerando o sintoma relevante e necessitado de avaliação e diagnóstico. Essa postura, no entanto, veio mudando ao longo dos anos, tanto que o próprio Stahl reconhece que tempos atrás ele via essas queixas “com muita desconfiança”.
Para o reumatologista Eduardo Paiva, membro da Comissão de Dor, Fibromialgia e Outras Síndromes Dolorosas de Partes Moles da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), o caminho é realmente esse. Caso o paciente se queixe de dor, deve-se considerar que ela, de fato, existe. E pode vir de processos depressivos ou não. Afirmando que “o cérebro é um só”, Paiva explica que várias áreas cerebrais relacionadas à dor estão também envolvidas na depressão. “Não existe dor sem emoção, principalmente em doenças crônicas, que causam uma resposta emocional maior, e vice-versa”, diz.
Segundo o médico, nas doenças crônicas acaba surgindo o estado de “sofrimento” provocado pela dor, que pode ser maior ou menor para cada indivíduo. “E não são só aspectos emocionais ou comportamentais que influenciam a capacidade de resistir à dor, mas igualmente os genéticos”, sublinha. Para Paiva, no entanto, fica um pouco controversa a ordem que o psiquiatra usa em sua definição, ao afirmar que a depressão causa a dor. Na fibromialgia, que se manifesta com dor no corpo todo, sobretudo na musculatura, ocorre o contrário. “Tudo é uma questão de ‘janela’”, assinala, referindo-se a pontos de vista diferentes. “Stahl vê pela janela da psiquiatria e nós, pela da reumatologia, mas a verdade está mesmo no meio do caminho”, sustenta.
O importante, ressalta, é sempre tratar a dor sob uma ótica multifatorial. “Podemos perguntar, por exemplo, o grau da dor, de zero a dez, o que, embora válido, não é a única pergunta que devemos fazer”, assinala. “O enfoque deve ser holístico, o que significa considerar muitos aspectos que envolvem o paciente, incluindo detalhes de sua vida cotidiana”, enfatiza.